Carta Aberta pelo Fortalecimento do Monitoramento Meteorológico e Hidrológico no Brasil

Importante para conscientizar o país para a necessidade de investimento no monitoramento meteorológico e hidrológico. O contexto que estamos é o de não haver, em muitas bacias hidrográficas, a devida quantidade de estações hidrometeorológicas, ou muitas das que existem estão sem manutenção e sem a atualização de dados.

A necessidade de haver um bom monitoramento hidroclimatológico nos países foi bem abordada na década hidrológica Predictions in Ungauged Basins (PUB) (2003-2012), iniciativa da International Association of Hydrological Sciences, (IAHS), mostrando como a falta dele traz desafios para a modelagem dessas bacias. Após, veio o Panta Rhei (2013- 2022) com o objetivo alcançar uma interpretação melhorada dos processos que governam o ciclo da água na sua dinâmica em conexão com os sistemas humanos em rápida mudança. De todo o modo, apesar dos adventos do sensoriamento remoto e da computação, os trabalhos publicados e feitos no âmbito da hidrologia com satélites utilizam séries de estações hidrometeorológicas para validar os dados de sensoriamento remoto em determinada porção do território para que, então, eles possam ser aplicáveis em uma maior área. Além disso, existem produtos de sensoriamento remoto que utilizam também, além dos sensores dos satélites, dados de estações in situ, esforços para melhores medições e controle desses processos.

Os programas PUB e Panta Rhei foram reunidos e rearticulados para incentivar novos estudos. Depois de duas décadas, em 2023 a IAHS quis mais uma vez impulsionar a comunidade por meio do lançamento de um terceiro
tema para esforços colaborativos em ciências hidrológicas: Hydrology Engaging Local People IN one Global world (HELPING), criado através de um processo comunitário participativo e da aplicação de planejamento estratégico. A terceira década científica da IAHS está sendo dedicada a soluções locais sob a crise hídrica global. Desse modo, cada território que esteja empenhado em auxiliar na resolução da crise hídrica global está lado a lado com a ciência e com o progresso.

➡️ Veja as atualizações da carta em: Carta Aberta pelo Fortalecimento do Monitoramento Meteorológico e Hidrológico no Brasil.

Nash-Sutcliffe (NSE) e Kling-Gupta (KGE)

Métricas de avaliação são utilizadas para analisar a performance de modelos. Na hidreologia, duas métricas amplamente utilizadas são as de Nash-Sutcliffe Efficiency (NSE) e de Kling-Gupta Efficiency (KGE).

Mas do que se trata cada uma delas? Como elas podem nos ajudar a avaliar a performance do nosso modelo e a interpretar o seu resultado?

O NSE tem um foco na leitura do erro quadrático médio e compara a magnitude dos erros de previsão do modelo com a variabilidade natural dos dados observados. Ele é calculado pela fórmula:

$$
NSE = 1 – \frac{\sum_{i=1}^{N}(S_i- O_i)^2}{\sum_{i=1}^{N} (O_i- \bar{O})^2}
$$

O NSE compara o erro do modelo com a variabilidade dos dados em torno da média. Um valor de NSE = 1 indica um ajuste perfeito, enquanto NSE = 0 significa que o modelo não é melhor do que simplesmente usar a média dos dados observados como previsão. Como o NSE se concentra apenas no erro entre os valores estimados e observados, comparando a soma dos erros quadráticos ao desvio dos valores observados em relação à sua média, isso significa que o NSE foca exclusivamente em quantificar o erro absoluto, sem considerar outros aspectos importantes como a correlação entre os valores simulados e os observados ou a variabilidade dos dados.

O NSE é muito sensível a outliers porque ele usa o erro quadrático na sua fórmula, o que significa que valores extremos podem impactar fortemente a avaliação do desempenho do modelo, pois o erro é elevado ao quadrado. Além disso, o NSE é conhecido por penalizar fortemente modelos que não capturam bem a média dos valores observados. Porém, o NSE também não leva em consideração de maneira explícita a variabilidade dos dados. Isso pode resultar em um bom NSE, mesmo se o modelo não estiver capturando corretamente as flutuações dos dados observados.

Dito isso, como o NSE depende fortemente do erro quadrático médio, ele pode não ser ideal em situações onde a distribuição dos erros é assimétrica, ou quando erros maiores precisam ser penalizados mais levemente. Além disso, o NSE pode falhar em avaliar adequadamente modelos que preveem extremos ou variabilidades com precisão.  

Por outro lado, o KGE (Gupta et al.,2009) avalia o desempenho de um modelo levando em consideração três componentes-chave:

Correlação (r): Mede o quanto os valores estimados e observados estão linearmente relacionados, ou seja, a capacidade do modelo de captar o padrão geral dos dados.

Viés relativo (β): Compara a média dos valores estimados com a média dos valores observados, indicando se o modelo tende a superestimar ou subestimar sistematicamente.

Variabilidade relativa (α): Mede a relação entre a variabilidade (coeficiente de variação) dos valores estimados e observados, o que reflete se o modelo captura bem a flutuação dos dados ao longo do tempo.

Sua equação, com as componentes supracitadas, pode ser vista abaixo:

$$
KGE = 1 – \sqrt{(r-1)^2+(β-1)^2+(α-1)^2}
$$

onde r é o coeficiente de correlação de Pearson; β é o erro relativo, ou $$β = \frac{\mu_s}{\mu_0};$$ e α é a variabilidade relativa, ou $$ α = \frac{\sigma_s}{\sigma_0}.$$

Uma biblioteca muito boa para calcular tanto o NSE quanto o KGE é a HydroErr, para Python. Em outro momento, irei fazer uma postagem sobre as melhores bibliotecas e pacotes para estudos hidrológicos.

Limitações do NSE e Vantagens do KGE:

  • Sensibilidade a outliers e variabilidade:

NSE é muito sensível a grandes erros (outliers), porque ele usa o erro quadrático na sua fórmula. Isso significa que valores extremos podem impactar fortemente a avaliação do desempenho do modelo, distorcendo a qualidade geral. Além disso, o NSE é conhecido por penalizar fortemente modelos que não capturam bem a média dos valores observados.

KGE, por outro lado, equilibra a avaliação do desempenho de maneira mais distribuída entre a correlação, o viés e a variabilidade, não sendo tão influenciado por outliers. Isso permite uma avaliação mais estável, mesmo em casos onde há grandes flutuações nos dados.

  • Captura da variabilidade dos dados:

O NSE foca principalmente no erro médio e não leva em consideração de maneira explícita a variabilidade dos dados. Isso pode resultar em um bom NSE, mesmo se o modelo não estiver capturando corretamente as flutuações dos dados observados.

O KGE, por outro lado, inclui a variabilidade relativa como um componente explícito. Isso é crucial em muitos contextos (como modelagem hidrológica ou ambiental), onde capturar a variabilidade ao longo do tempo é tão importante quanto prever a média correta.

  • Interpretação dos resultados:

NSE: Uma das limitações do NSE é que ele pode produzir resultados negativos, o que dificulta sua interpretação. Um NSE negativo significa que o modelo é pior do que usar simplesmente a média dos dados observados como previsão. No entanto, a gravidade do “quão ruim” o modelo é pode não ser intuitiva. Além disso, valores de NSE próximos de zero ainda podem resultar em um ajuste inadequado.

KGE: O KGE varia de -∞ a 1, mas com uma interpretação mais simples. Um valor de KGE = 1 indica um ajuste perfeito, e quanto mais o KGE se afasta de 1, pior é o desempenho do modelo. O fato de o KGE incorporar múltiplos componentes facilita a identificação de onde o modelo está errando (seja em correlação, viés ou variabilidade), enquanto o NSE fornece uma visão agregada e menos informativa.

  • Flexibilidade e aplicabilidade:

NSE: Como o NSE depende fortemente do erro quadrático médio, ele pode não ser ideal em situações onde a distribuição dos erros é assimétrica, ou quando erros maiores precisam ser penalizados mais levemente. Além disso, o NSE pode falhar em avaliar adequadamente modelos que preveem extremos ou variabilidades com precisão.

KGE: O KGE é mais flexível e aplicável em uma gama mais ampla de situações. Por exemplo, em séries temporais complexas ou em modelos ambientais/hidrológicos, ele é mais confiável porque leva em conta múltiplas dimensões do desempenho do modelo, não apenas o erro absoluto.

Por fim, a tabela abaixo reúne um resumo de informações sobre o NSE e o KGE:

Vale lembrar que, com o passar dos anos, vários estudos foram sendo desenvolvidos para avaliar adaptações de ambas as fórmulas, bem como a criação de outros índices. O próprio KGE partiu de um estudo feito para encontrar uma alternativa para o tradicional coeficiente NSE.

Referências Bibliográficas:

Nash, J. E., & Sutcliffe, J. V. (1970). River flow forecasting through conceptual models part I – A discussion of principles. Journal of Hydrology, 10(3), 282-290.

Gupta, H. V., Kling, H., Yilmaz, K. K., & Martinez, G. F. (2009). Decomposition of the mean squared error and NSE performance criteria: Implications for improving hydrological modelling. Journal of Hydrology, 377(1-2), 80-91.

Ferramentas para visualização de furacões

Diante do que vem acontecendo desde a semana passada, com a formação do furacão Milton, no Golfo do México, a Flórida (EUA) se prepara para receber essa força da natureza, que pode ser o pior furacão a atingir o estado em 100 anos. Isso acontece a pouco menos de duas semanas do furacão Helene, que também gerou consequências não somente na Flórida, mas em outros estados americanos como Carolina do Sul, Carolina do Norte, Geórgia, Tennessee e Virgínia. A comunidade científica se esforça para fazer modelos e previsões para esse tipo de fenômeno, a fim de evitar maiores perdas e danos.

O órgão do governo americano encarregado de estudar esses fenômenos é a National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), que se concentra em monitorar e entender os oceanos e a atmosfera, desempenhando papel fundamental na proteção e gestão do meio ambiente e na promoção da segurança pública através de informações meteorológicas e ambientais. Satélites como GOES e POES, operados pela NOAA, são peça chave para a construções de modelos atmosféricos e oceânicos.

Dito isso, dashboards que são utilizados pela comunidade científica e também estão disponíveis em plataformas online para a população, tornam-se extremamente úteis em momentos como esse de se preparar para o que está por vir. Desse modo, divulgarei 3 endereços eletrônicos de diferentes dashboards úteis da NOAA.

O caminho do furacão

O primeiro é o Live Hurricane Tracker, que mostra o trajeto de furacões provenientes da modelagem realizada com diversas fontes de dados, não tendo uma escala de visualização temporal definida, mas que pode ser apresentado em tempo real (real time) ou próxima ao tempo real (near real-time).

Live Hurricane Tracker. A plataforma pode ser vista aqui:
https://www.nesdis.noaa.gov/imagery/hurricanes/live-hurricane-tracker

Além disso, nesta página https://www.nhc.noaa.gov/?atlc é possível ver um detalhamento sobre o furacão Milton.

Furacão Milton visto do espaço.

O mundo em tempo real

O segundo link é referente ao The World in Real Time, que fornece dados e visualizações em tempo real relacionados a vários fenômenos ambientais e atmosféricos. No contexto desse post, é possível ver o olho do furacão e sua capa de nuvens convectivas.

The World in Real Time. A plataforma pode ser vista aqui:
https://www.nesdis.noaa.gov/imagery/interactive-maps/the-world-real-time

No link acima, só esteja certo de selecionar a camada Global satellite map.

Temperatura dos oceanos

Por fim, um terceiro link que também é interessante analisar, é o Coastal Water Temperature Guide, dashboard que mostra dados em tempo real sobre as temperaturas da água ao longo das regiões costeiras. Este painel é valioso para pesquisadores, pescadores, ambientalistas e qualquer pessoa interessada em condições costeiras, fornecendo informações essenciais para entender e gerenciar ambientes marinhos.

No nosso contexto, é útil para ver e entender os locais no oceano passíveis de se formarem furacões, considerando a variável de temperatura da água dos oceanos. Além disso, pode-se dizer que é possível ter uma ideia, aquém dos modelos, onde um furacão pode começar a perder a sua força, já que sua energia se dissipa ao encontrar águas mais frias.

Coastal Water Temperature Guide. A plataforma pode ser vista aqui:
https://coastalwatertemperatureguide-noaa.hub.arcgis.com